quarta-feira, 26 de julho de 2017

Vereador divulga na imprensa Carta Aberta ao prefeito Carlos Eduardo

CARTA ABERTA AO PREFEITO CARLOS EDUARDO 

ASSUNTO: SEGURANÇA PÚBLICA

De SP para Natal, em 26 de julho de 2017.

Caro Prefeito Carlos Eduardo,

Estando em viagem particular tive conhecimento que ontem, no noticiário RN TV, foi questionada uma lei de minha autoria, do ano de 2009, quando Vossa Excelência não era ainda Prefeito, que proíbe a circulação de carros fortes no horário comercial e próximo às escolas.

Essa é uma norma vigente nas maiores cidades do mundo, visando à proteção e segurança do cidadão.

No Brasil, em situações similares, o STF já se pronunciou, como adiante comprovo, sobre a constitucionalidade dos municípios legislarem nessa área de “segurança” e “interesse local”.
Naturalmente, serei obrigado a discutir em todas as instâncias, se necessário, a constitucionalidade da minha iniciativa legislativa, até preservando a condição de advogado.
Todavia, não desejo polemizar e passo a expor argumentos, fundamentos jurídicos e jurisprudência, que justificam a vigência da lei, que seria impugnada pelo próprio município de Natal, segundo o noticiário do RN TV.

Nunca época de insegurança generalizada, esse questionamento, sem dúvida, afetaria a credibilidade política da Prefeitura Municipal, insurgindo-se contra um instrumento que poderá assegurar maior tranquilidade ao natalense.

Esclareço, por oportuno, que ao encaminhar o projeto de lei, do qual resultou a Lei 0279/2009, recebi pressões e protestos de empresas de segurança privada de Natal, alegando aumento de custos para a implementação da norma.

Tal fato, não impediu que prosseguisse na tramitação legislativa, em razão de que o único propósito seria garantir maior segurança à população.

Por isso, como líder de Vossa Excelência, a quem cabe defende-lo na Câmara Municipal, e no desejo de ajudar, envio os esclarecimentos abaixo, dispondo-me ao diálogo produtivo, que resulte até em proposta de parcerias do município de Natal, na esfera estadual e da própria União (Ministério da Justiça), para o cumprimento dessa legislação, cuja aprovação popular é generalizada na cidade de Natal.

CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 0279/2009
Determina horário diferenciado para circulação dos carros fortes em estabelecimentos comerciais.
“Tudo já foi dito uma vez, mas como ninguém escuta é preciso dizer de novo”.  (André Gide)
1. Em várias instâncias de debates, a conclusão unânime é que os municípios têm um papel central para o aperfeiçoamento da segurança pública no Brasil. O objetivo é o desenvolvimento de estratégias preventivas, que combinem, sob o paradigma da segurança urbana e a partir de diagnósticos locais consistentes, a adoção de ações preventivas para a redução da violência, da criminalidade e preservação da ordem urbana.

2. Nesse sentido são buscadas atualmente, com determinação pelas administrações municipais, parcerias entre as unidades federadas (Estados e União), como forma de cooperação intergovernamental e temática. 

3. Sem dúvida, essa seria uma alternativa para a Prefeitura Municipal de Natal executar ações na área de segurança pública e, consequentemente, cumprir a lei 0279/09, ao invés de impugná-la como inconstitucional, gerando perplexidade na população.

4. A segurança pública não poderia passar despercebida dos administradores e legisladores municipais, pois a sua inserção no contexto social vem desde o preâmbulo da própria Constituição do Brasil:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar,

5. E é justamente a Constituição Federal que adotou o sistema de competências reservadas ou enumeradas para os Municípios, de forma implícita ou explícita.

6. Senão vejamos.

7. A primeira competência municipal enumerada na Constituição Federal (art. 30, I) é a de legislar sobre assuntos de interesse local. Segundo Hely Lopes Meirelles, o “interesse local” se caracteriza pela predominância (e não pela exclusividade) do interesse para o Município, em relação ao do Estado e da União, o que se consubstancia através da competência legislativa”.

8. "Interesse local" pressupõe a predominância do interesse local e nesse caso a competência dos Municípios se destaca sobre os demais entes políticos, em razão de que é no Município onde o cidadão sobrevive, dirige a sua família, trabalha, produz, como membro da coletividade. 

9. Transborda a convicção de que normas sobre “segurança pública” se caracterizam como “interesse local”, desde que sejam complementares e não se oponham às regras pré-fixadas pelos Estados e a União.

10. Como admitir-se que seja constitucional o município agir e fiscalizar, através de sua guarda municipal, e seja inconstitucional determinar, por lei, horário diferenciado para circulação dos carros fortes em estabelecimentos comerciais?

11. Tanto exclusiva, ou complementar, o Município deve necessariamente instituir suas leis e regulamentos, permitindo aos seus agentes fiscais o exercício legal de suas funções.

12. Pelo exposto, não se pode negar ao município significativa participação na segurança pública. A cada dia aumenta a exigência dessa participação pela população. 

13. Tanto em caráter de competência legislativa exclusiva, ou suplementar, o Município deve instituir leis e regulamentos, permitindo aos seus agentes o exercício legal de funções preventivas e de fiscalização na área da segurança coletiva, complementando, no interesse público, ações de outros entes políticos, como o Estado e a União.

14. Que mal, ou inconstitucionalidade, haveria no exercício dessa competência pelos municípios brasileiros?

15. Nesse particular, observe-se por fundamental o disposto no artigo 30, da Carta Magna, ipsis litteris:

Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

16. Em artigo anterior, o de número 23, a Constituição é enfática ao estatuir de forma implícita, a responsabilidade dos municípios na área de segurança pública:
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público;

17. Configura-se a competência municipal implícita, para zelar e guardar a Constituição, através de leis e normas próprias, em função do disposto no artigo 144 da Lei Maior, ipsis litteris: 
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (grifo nosso).

18. Cabe destacar, ainda, o princípio da competência municipal, consignado no artigo 182, da Constituição:
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.

19. O advogado Souza Neto (2008, p. 50), analisando legalmente a competência municipal na área da segurança pública pontificou:
Os municípios podem atuar na segurança pública através da imposição de restrições administrativas a direitos e liberdades. O município pode, por exemplo, delimitar o horário de funcionamento de bares e restaurantes, ou os locais da venda de bebidas alcoólicas. Tais restrições, de caráter administrativo, exercem importante função na segurança pública, prevenindo a prática de delitos. Na região metropolitana de São Paulo, mais de 20 municípios já editaram leis restringindo o horário de funcionamento de bares. Em alguns casos, a redução do número de homicídios chegou a 60% (Diadema) e a de acidentes de trânsito a 70% (Barueri). (grifo nosso)

20. O Eminente Ministro Joaquim Barbosa, do STF, relatando processo acerca de lei municipal, com medidas de controle no atendimento aos usuários de serviços bancários, portanto, similar aos usuários e frequentadores de shoppings, consagrou o entendimento, aliás, adotado à unanimidade na Suprema 

Corte:
Processo AI 536884 RS (Relator Joaquim Barbosa)
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR. MUNICÍPIOS. ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS. SEGURANÇA. INTERESSE LOCAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. Esta Corte, em diversos precedentes, firmou entendimento no sentido de que se insere na competência dos Municípios para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I da Constituição Federal) dispor sobre medidas referentes à segurança, conforto e rapidez no atendimento aos usuários de serviços bancários, tais como, por exemplo: estabelecer tempo de atendimento ao público, determinar a instalação de sanitários em agências bancárias e equipamentos de segurança, como portas de acesso ao público.

21. Na mesma linha de reconhecimento da competência municipal para editar leis absolutamente semelhantes à de número 0279/2009, do município de Natal, em questionamento, pronunciou-se o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL nos arestos a seguir transcritos:

ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS – COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA, MEDIANTE LEI, OBRIGAR AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS A INSTALAR, EM SUAS AGÊNCIAS, DISPOSITIVOS DE SEGURANÇA – INOCORRÊNCIA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA FEDERAL – RECURSO IMPROVIDO. – O Município dispõe de competência, para, com apoio no poder autônomo que lhe confere a Constituição da República, exigir, mediante lei formal, a instalação, em estabelecimentos bancários, dos pertinentes equipamentos de segurança, tais como portas eletrônicas ou câmaras filmadoras, sem que o exercício dessa atribuição institucional, fundada em título constitucional específico (CF, art. 30, I), importe em conflito com as prerrogativas fiscalizadoras do Banco Central do Brasil. Precedentes.

(RE 312050 AgR, Relator:  Min. Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 05/04/2005, DJ 06-05-2005 PP-00032, RTJ VOL-00194-02 PP-00693).

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. NORMAS ADMINISTRATIVAS MUNICIPAIS QUE DISCIPLINAM O HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO DO COMÉRCIO LOCAL. COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA OS ASSUNTOS DE SEU INTERESSE: ART. 30, I, DA CONSTITUIÇÃO. Os Municípios têm autonomia para regular o horário do comércio local, desde que não infrinjam leis estaduais ou federais válidas, pois a Constituição lhes confere competência para legislar sobre assuntos de interesse local. Agravo Regimental a que se nega provimento.
(AI 622405 AgR, Relator:  Min. Eros Grau, Segunda Turma, julgado em 22/05/2007, DJ 15-06-2007 PP-00037)

22. Indaga-se: como seria possível admitir que o município possa determinar horário de funcionamento do comércio local e obrigar instituições financeiras instalar em suas agências dispositivos de segurança, e, no caso específico da lei 0279/2009, ser considerada INCONSTITUCIONAL a determinação de horário diferenciado para a circulação dos carros fortes em estabelecimentos comerciais, na cidade de Natal? (grifo nosso)

23. Cabe citar a competência das “guardas municipais”, autorizadas pela Constituição, através da lei 13.022/2014, que prescreve, ipsis literis:

Art. 30  São princípios mínimos de atuação das guardas municipais:  
I - proteção dos direitos humanos fundamentais, do exercício da cidadania e das liberdades públicas;  
II - preservação da vida, redução do sofrimento e diminuição das perdas;  

24. A fiscalização na aplicação da lei municipal de Natal 0279/2009 poderia ser feita pela Guarda Municipal do município, ou outro órgão da administração local.

25. Como se vê a lei 0279/2009 inclui-se claramente na competência legislativa municipal, estando intimamente vinculada ao poder de polícia do Município e apoiada pela Constituição e leis suplementar a legislação federal e estadual. 

26. Não há como ser tida, data vênia, como legislação inconstitucional, apenas pelo fato de que as empresas operadoras da segurança de carros fortes entendam que a sua aplicação implicará em aumentos de custos.

Senhor Prefeito Carlos Eduardo,

Estes os esclarecimentos que presto a Vossa Excelência, acerca da lei municipal 0279/2009, de minha autoria.

De antemão coloco-me a disposição para diálogo pessoal, onde reafirmarei os fundamentos acima enunciados, na certeza de que prevalecerá o bom senso, evitando litígio de inconstitucionalidade, acerca de um tema sensível à população que é a segurança pública.

Cordialmente,

NEY LOPES JR 
Vereador